sexta-feira, 14 de setembro de 2007

A Maré Encheu....parte 4

"Quando os antepassados marienses se ocupavam a disparar canhoadas para repelir mouros, corsários e demais saqueadores da baía da Praia Formosa, seria difícil de imaginar que o Forte de São João Baptista, onde se defendiam dos forasteiros, se iria transformar em palco secundário do maior encontro de culturas que se realiza nas ilhas de bruma. A direcção do festival Maré de Agosto arriscou segmentar o público e venceu: terminados os excelentes espectáculos principais no pasto feito anfiteatro, e enquanto a maior parte dos boat people anestesiavam a mente com doses massivas de música electrónica, o espírito de marés passadas espraiou-se pelas ruínas do Espaço Castelo. Entre as muralhas, o recinto: a iluminação ténue, o luar claro e o rumorejar das ondas ali ao lado criavam uma atmosfera mística, quase medieval, que transportou o público para outras alturas de maré, outras vagas de descobertas musicais. Sons galaico-portugueses (Mandrágora), jazz (YDBand) e ska/ folk (Kumpania Algazarra) adequaram-se na perfeição ao cenário, repleto de velhos conhecedores da preia-mar e da baixa-mar, donos do absoluto privilégio de, nos últimos 23 anos, terem conhecido o mundo através de expressões musicais dos cinco continentes - sem nunca precisarem de sair da ainda esplêndida Praia Formosa, um recanto perdido no Atlântico. Antes, sublinhe-se, de sequer ter sido inventada a expressão world music, criada para rotular sonoridades de estilos indefiníveis, tal como o é o próprio festival, albergue de todas as músicas; sem nunca ter tido, diga-se, o justo reconhecimento da inteligentsia cultural dos media nacionais. A inovação, na edição de 2007, rendeu os seus frutos. Criou uma fusão entre popular e erudito, entre revelação e confirmação, entre comercial e marginal, sem ceder ao facilitismo pimba que anda por aí.
E oEspaço Castelo foi o símbolo maior desse difícil compromisso. Até se diz que, após de décadas de abandono, a recuperação patrimonial do forte se vai iniciar. Se isso
significar que para o ano as marés não atingem o castelo, quase que é preferível desejar que fique como está."

in http://mautemponojornal.blogspot.com/2007/09/esprito-de-mars-passadas.html

Sem comentários: